A modulação dos ecossistemas microbianos pode ser a chave para encontrar novas soluções para alguns dos principais desafios mundiais da saúde. O potencial terapêutico dos probióticos para doenças como a obesidade, problemas de fertilidade, fadiga e infeções, tem apresentado resultados promissores.

Estimulada pelos avanços tecnológicos da biologia, a investigação sobre a microbiota humana e os probióticos tem avançado significativamente, abrindo caminho para diversas abordagens terapêuticas. Segundo a nutricionista Filipa Horta, os probióticos estão naturalmente integrados numa abordagem terapêutica com base na medicina personalizada pela sua capacidade de modular a microbiota humana. Explica que os probióticos têm a capacidade de modular a microbiota intestinal de formas específicas. Ou seja, ao selecionar estirpes probióticas que atuem de maneira direcionada, é possível personalizar tratamentos para melhorar a saúde intestinal e extraintestinal de acordo com as necessidades individuais de cada pessoa.

“Temos vindo a assistir a grandes avanços científicos na compreensão das interações entre a microbiota e o organismo humano. Isto permite aos investigadores isolar estirpes específicas de acordo com os seus benefícios para a microbiota e para a saúde. O potencial terapêutico para doenças como a obesidade, alergias, problemas de fertilidade, fadiga e infeções, é imenso e tem apresentado resultados promissores”, refere.

Filipa Horta explica que a microbiota é o conjunto de microrganismos que habitam no organismo: micróbios, bactérias, fungos, etc. Estes micróbios, vivem em comunidades no nosso corpo e cada uma destas comunidades tem uma impressão digital única em cada pessoa. De entre as microbiotas – pele, ouvidos, boca, pulmões, vagina – a intestinal é a mais predominante,  ajuda na absorção dos nutrientes e a prevenir e regular infeções em todo o organismo. Além disso, sabe-se que existe uma complexa comunicação bidirecional entre o intestino e o cérebro, pelo que o intestino é, há muito tempo, apelidado de segundo cérebro.

90% das doenças da atualidade estão relacionadas com a microbiota

“Embora haja ainda muito caminho para desbravar, podemos afirmar hoje que 90% das doenças da atualidade estão, de alguma forma, ligadas à microbiota”, afirma. Até em várias doenças psiquiátricas, foram identificados desequilíbrios da microbiota, como a esquizofrenia, a depressão e as perturbações obsessivo-compulsivas.

Os estudos para abordagens terapêuticas com recurso a probióticos prosseguem em várias frentes, abrangendo uma multiplicidade de doenças, e já com muita evidência científica. Os microrganismos mais usados como probióticos são as próprias bactérias (boas) que existem na microbiota humana ou de produtos lácteos fermentados – os lactobacilos, as bifidobactérias‎  ou leveduras, como o Saccharomyces boulardii, provenientes da casca da lichia. Sejam com origem no leite, frutas ou no corpo humano, as espécies de microrganismos potencialmente benéficas têm sido estudadas detalhadamente para encontrar as estirpes mais interessantes para a medicina.

Filipa Horta dá alguns exemplos de aplicação prática comprovada de probióticos na abordagem a diversas doenças

Distúrbios do aparelho digestivo

Leveduras como o Saccharomyces boulardii, proveniente da casca da lichia, têm revelado eficácia no tratamento e prevenção da diarreia aguda em crianças e adultos (gastroenterites, por exemplo), assim como na diarreia provocada pela toma de antibióticos. O mesmo sucede com a bifidobactéria Bifidobacterium longum, da estirpe 35624, no apaziguamento do desconforto gastrointestinal recorrente, relacionado, por exemplo, com a síndrome do intestino irritável.

Infeções respiratórias de inverno

Algumas espécies de bactérias probióticas, como Lactobacillus plantarum, Lactobacillus Rhamnosus GG e Bifidobacterium Lactis, têm evidência científica em diversos estudos internacionais na prevenção das infeções do trato respiratório. Em alguns casos, esses benefícios estendem-se à redução do risco de infeções respiratórias sazonais, com alguns estudos a demonstrar uma redução de 28% da sua incidência, menos 33% de risco de severidade dos sintomas e menor duração dos sintomas. O Lactobacillus Rhamnosus GG, apresenta ainda potencial benefício na diminuição do risco de asma e rinite alérgica.

Obesidade

Há estudos que comprovam, por exemplo, que existem enterobactérias que conseguem produzir uma proteína, ClpB, capaz de ativar vias neuroniais associadas à saciedade, o que para o controlo do peso é muitas vezes um fator decisivo. Nos casos em que foi utilizada especificamente a estirpe Hafnia alvei HA4597 observou-se, além redução da ingestão alimentar por menos apetite, uma potenciação da perda de adiposidade (gordura).

Infeções urinárias

Há um interesse crescente em métodos alternativos de prevenção das infeções do trato urinário em alternativa aos antibióticos. O uso de probióticos contendo lactobacilos, como as estirpes Lactobacillus rhamnosus LR06 e Lactobacillus plantarum LP02, revelaram eficácia no apoio ao reequilíbrio da microbiota vaginal em mulheres com tendência para infeções urinárias.

Stress e ansiedade

Estudos em animais comprovaram que a microbiota está envolvida na regulação das emoções através da comunicação entre o intestino e o cérebro. Se a microbiota não estiver equilibrada, esta comunicação é menos eficaz e favorece o aparecimento de perturbações de humor. Além dos tratamentos clássicos (antidepressivos, reguladores do humor, psicoterapia, etc.) está aberto um novo caminho: reequilibrar a microbiota para influenciar o humor. Um estudo recente mostrou que a toma de probióticos diariamente, uma combinação de lactobacilos e bifidobactérias, melhora o humor e reduz o nível de ansiedade em pessoas saudáveis.

De: https://lifestyle.sapo.pt