Portugal está entre os cinco países com mais casos de depressão na União Europeia. Falámos com a médica Ana Matos Pires, psiquiatra e membro da Coordenação Nacional das Políticas de Saúde Mental (CNPSM) do Ministério da Saúde.
A depressão é uma das doenças mentais com maior incidência em Portugal. Quais considera serem os fatores que mais contribuem para o desenvolvimento de depressão?
As perturbações depressivas são um conjunto diverso de patologias de diferente gravidade e cujos fatores etiológicos são múltiplos. Não há uma causa única para o adoecer depressivo, estando implicados fatores de ordem biológica, nomeadamente constitucional, genética e hereditária, e fatores ambientais, dos quais se destacam os relacionados com questões familiares, laborais, económicas e sociais.
Por que motivos a depressão tem maior incidência em Portugal do que em outras sociedades?
Este é um assunto que não está completamente estudado, e que merece sê-lo. Os estudos epidemiológicos e a investigação clínica básica, particularmente na área da saúde mental, são precários em Portugal. O investimento neste tipo de estudos tem sido muito descurado e a situação tem forçosamente de ser modificada. Só com bons dados se podem desenvolver boas estratégicas preventivas e de intervenção. Esta é uma área prioritária para a Coordenação Nacional das Políticas de Saúde Mental e faz parte da Reforma da Saúde Mental que está em curso.
Valorizamos as coisas erradas? Temos tipos de pensamento menos protetores?
Provavelmente, até por aprendizagem, somos um povo estruturalmente “negativista”, mas isso não explica tudo. O estigma associado à doença mental, a deficiente literacia em saúde mental e o não investimento em medidas de promoção da saúde mental e de prevenção da doença, de diagnóstico e tratamento precoces respondem, com toda a certeza, à atual realidade.
A depressão é considerada a epidemia dos dias modernos. De que forma é que o novo Centro de Responsabilidade Integrada (CRI) para a Saúde mental, na unidade local de saúde (ULS) de Lisboa Ocidental, vem ajudar a atenuar os efeitos da mesma?
A criação dos 15 primeiros Centros de Responsabilidade Integrados (CRI) de Saúde Mental, na forma de projetos piloto, é um propósito inscrito no Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) para a área da Saúde Mental. É um novo modelo de organização dos Serviços Locais de Saúde Mental em Portugal, integrado na reforma da Saúde Mental, que vai a meio, que tem o consenso generalizado dos profissionais e cuja continuidade o Governo já declarou apoiar.