Teletrabalho “passa a ser simplesmente recomendado sempre que as atividades o permitam”, anunciou esta quarta-feira António Costa. Regras a aplicar passam a ser as previstas no Código do Trabalho. Quem quiser manter-se em trabalho remoto terá de chegar a acordo com o empregador
Não haverá uma nova prorrogação da obrigatoriedade do teletrabalho em todo o território nacional. É António Costa quem o garante. Em declarações aos jornalistas à saída do Conselho de Ministros desta quarta-feira, o primeiro-minisitro anunciou que “a partir de 14 de junho, o teletrabalho deixa de ser obrigatório e passa a ser simplesmente recomendado sempre que as atividades o permitam”. A prorrogação da obrigatoriedade do teletrabalho em todo o país, anunciada na passada quinta-feira – a segunda fora do estado de emergência – foi alvo de forte contestação por parte dos empresários, com o Conselho Nacional das Confederações Patronais (CNCP) a defender esta quarta-feira o fim desta imposição que consideram “desproporcional, inconstitucional e errada”.
Sindicatos e patrões contestaram a obrigatoriedade do teletrabalho desde o fim do estado de emergência, mas o Governo optou sempre por mantê-lo. Até agora. Com a entrada numa nova fase de desconfinamento, o Conselho de Ministros desta quarta-feira aprovou o levantamento desta imposição a partir de 14 de junho, sinalizando que o teletrabalho passa apenas a ser “recomendado nas atividades que o permitam”, mas não obrigatório como até aqui.
Recorde-se que, ainda que obrigatório, as regras atualmente em vigor para o teletrabalho eram já mais flexíveis do que as que vigoraram em janeiro, durante o confinamento geral e o estado de emergência. No regime atual, embora o teletrabalho possa ser decretado sem necessidade de acordo entre as partes, ele pode ser recusado, quer pelo trabalhador quer pelo empregador, desde que devidamente justificado e comunicado por escrito. E, caso o empregador não aceite o pedido ou a recusa do trabalhador, este pode requerer a intervenção da Autoridade para as Condições de Trabalho (ACT) quem cinco dias para se pronunciar.
Regressa o regime do Código de Trabalho
Em março, o Executivo tinha prorrogado o Decreto-Lei n.º 79-A/2020, que enquadra regime de teletrabalho e desfasamento de horários, até 31 de dezembro, nos concelhos com elevado risco de contágio. Essa regra vai manter-se nos concelhos de maior risco de contágio. Continuará a ser feita uma avaliação semanal e os concelhos que registem durante duas semanas consecutivas um número de casos acima de 120 por cada 100 mil habitantes recuarão no plano de desconfinamento e, no caso do teletrabalho, poderão ver a sua obrigatoriedade novamente imposta sem necessidade de acordo entre as partes, como consta do Decreto-Lei n.º 79-A/2020. Nos concelhos de baixa densidade a fórmula de análise é diferente, sendo considerado um número de novos casos superior a 240 por cada 100 mil habitantes.
Nos restantes concelhos do país, e de acordo com o que foi hoje anunciado por António Costa, a partir de 14 de junho as regras serão outras já que o teletrabalho passa apenas a ser “recomendado” em todo o território nacional, levantando o Governo a obrigatoriedade que ainda vigora. O regime a aplicar a partir desta data será o inscrito no Código do Trabalho. Significa isto que os profissionais que desejem manter-se em trabalho remoto, ou as empresas que optem por prolongar este regime, terão sempre de formalizar um acordo escrito.
Sindicatos e patrões já tinham manifestado “incompreensão” pela decisão de manter o teletrabalho obrigatório em todo o território nacional, sem diferenciação por grau de risco. Ao Expresso, Sérgio Monte, secretário-geral adjunto da UGT, disse não encontrar razões “para que não tenhamos passado à fase seguinte”, em que a imposição do teletrabalho se aplicaria apenas aos concelhos com elevado risco de contágio. E sinalizava que “o objetivo que norteou a determinação da obrigatoriedade do teletrabalho era retirar pessoas dos transportes coletivos nas zonas de maior concentração populacionais, como as grandes áreas metropolitanas. Isso poderia continuar a ser assegurado, levantando progressivamente essa obrigatoriedade em zonas de menor risco”, sinaliza.
Do lado da CGTP a decisão da passada semana também foi encarada com surpresa. “Mesmo com a subida recente do número de casos em Lisboa, nada impediria que se passasse à etapa seguinte, concretizando o progressivo levantamento da obrigatoriedade do teletrabalho nos concelhos de menor risco”, referiu Andrea Araújo, representante da central sindical, que dizia não compreender “uma nova prorrogação do teletrabalho em todo o território”. Ambos defendiam um regresso rápido à normalidade, recuperando o caráter voluntário e reversível que está previsto na lei.
Já entre os patrões, João Vieira Lopes, presidente da Confederação do Comércio e Serviços de Portugal (CCP), também classificou de “estranha” a decisão de prorrogar mais uma vez a obrigatoriedade do teletrabalho em todo o território nacional admitindo: “não vemos na evidência científica ou sequer na opinião dos especialistas, que isto possa ter um grande impacto no controlo da pandemia e, pelo contrário, tem um impacto muito negativo na economia”.
Esta quarta-feira, antes de conhecida a decisão do Conselho de Ministros, o Conselho Nacional das Confederações Patronais (CNCP) – que reúne as confederações dos Agricultores de Portugal (CAP), do Comércio e Serviços de Portugal (CCP), Empresarial de Portugal (CIP), do Turismo de Portugal (CTP) e Portuguesa da Construção e do Imobiliário (CPCI) – defendia o fim da obrigatoriedade do teletrabalho a 14 de junho, manifestando a “mais frontal reprovação” face a uma medida que os patrões consideram “desproporcional, inconstitucional e errada”.